Vejo-me no vale das árvores seculares
Estou parado, pequeno em meio as copas
Que me fitam com a certeza de que vou passar
E passando adubarei seus pés,
Com as sobras de minha finitude
Vejo-me no vale das árvores seculares
E da minha pequenez meus olhos fecho
Sinto em minhas veias a seiva borbulhar
E sigo verdejando nesse devaneio
Esse desejo, essa inveja infame
De me perpetuar secularmente entre elas
Varar o céu com meus ramos verdes, pontiagudos
E me apossar dos primeiros beijos do sol
Eu do meu alto cume secular, eu
Pleno, etéreo, árvore, raízes na terra, cabeça no céu
Que bebo das gotas do orvalho e da neblina faço véu
Eu bela árvore, cujo vento me balança em valsa
Árvore de frondosa sombra
Com meu tronco marcado por juras de amor
Que suportei os entalhes dos corações enamorados
Que se partiram como galhos quebrados
Tatuagens das promessas feitas em vão
Vejo posar sobre meus braços passarinhos
Que entre meus dedos tecem os seus ninhos
Ao fim da tarde sobre meu colo pousam a descansar
Quando eu morrer não quero ir para o céu
Que me plantem embaixo da terra
E se alguém chorar em minha partida
Reguem-me as lágrimas da despedida
Para que eu brote como árvore secular