quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Caleidoscópio




Tenho todas as cores em mim
O branco da paz que não encontrei
O azul do céu que nunca toquei
O verde esperança que jamais tem fim

No amarelo do medo a me embotar assim
No vermelho do sangue me apavorei
No preto véu da noite, cego tateei
No rosa da tua carne descansei enfim

Todas as nuances desse etéreo arco
No balançar das tuas ancas feitas de giz
A deslizar no meu leito, doce meretriz

Entre tuas coxas vou fincar meu marco
Arder em suores, calores febris
Vou pintar o sete, te fazer feliz.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Segredos de mulher.


Não perguntes nunca do passado
Da mulher se não queres sofrer
Natural da companheira esconder
As aventuras da sua vida para o amado

Passado perfeito, limpo e ilibado
É a imagem que se quer vender
Pelo simples medo de perder
O novo amor que agora se tem ao lado

Histórias toda fêmea tem
Umas mais puras outras nem tanto
Contos de alcova que não convém

Mas não te julgo e nem a ninguém
Se te escondes detrás do manto
É pra não veres partir o teu bem.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Sair da margem, mergulhar em mim.





Cansei de viver a margem de mim
Observar de fora o acontecimento
Expectador da vida, do seu movimento
Essa ausência, essa coisa ruim

Não quero mais viver assim
Estar de fora, esse afastamento
Sob o olhar do outro, esse julgamento
Quero a liberdade, respirar enfim

Rédeas da vida, ter na minha mão
Dominar meu sim, disparar meu não
Caminhar na serra, flutuar no mar

Beijar a menina, mergulhar no ar
Eu dentro de mim, minha habitação
Abraçar minh´alma, ver meu coração.

domingo, 20 de setembro de 2009

É mais forte do que eu.





Como um zunido constante, uma abelha
Escuto essa voz que não cala
Uma chama, uma brasa, centelha
É papel e caneta e tudo me abala

Ecoam os pingos da chuva na telha
Me ponho louco a caminhar na sala
Traga-me vinho, solução vermelha
Limpando a mente, clareando a fala


Essa secura de escrever não cessa
Mesmo que eu cansado, pare, ore, peça
Mesmo que cesse o clamor da alma

Nada que eu faça há que impeça
Dê-me uma folha, saia e se despeça
Se não escrevo, nada mais me acalma.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Gato pingado???




Não conheci Fulano
Nem Cicrano
Nem o Zé ninguém

Esse Gato pingado
Essa Alma penada
Beltrano? Eu heim

É tanta pouca gente
Quando se quer falar
Que tanta gente não tem

É tanta gente sem rosto
Sem pé, nem cabeça, sem gosto
Sem nexo tanta gente vem

Habitar os lugares vazios
Das festas e dos bailes sombrios
Ausência de tanto alguém

Acredito em alma penada
Fulano e cicrano
Beltrano? Acredito também

Mas o que danado é gato pingado?
E se pinga, pinga em cima de quem?
E se existe onde diabo tem?

Amor de menino.




Parece estranho esse desatino
Esse sonho a me seguir
Será real ou quer me iludir?
Isso que me habita desde menino

Esse brilho a me conduzir
Radiante qual um sol matutino
A tua voz som do cristalino
Canta a sereia a me seduzir

Te quis desde a mais tenra idade
Com doçura nunca com maldade
Um abraço apenas, esse teu calor

Crescemos eu e tu e essa temeridade
De te ver partir e só restar saudade
E eu ficar menino sem o seu amor

Soneto do breve encontro.




Luz para meu peito
Foi conhecer-te aquele dia
Andar ao teu lado, admirar teu jeito
Guardar em mim a tua geografia

Eu que de desilusão era feito
Mergulhado em minha apatia
Escutei num compasso perfeito
Meu coração saltar de alegria

E segui a caminhar teus passos
Ditando um resumo de nossas vidas
Buscando estabelecer os laços

Conexões antes das despedidas
Sonhando em tê-la em meus braços
Evitando as tuas partidas

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Amor Errante




O teu silêncio é o que me mata
Antes uma briga, um escarro, a desavença
A sentir na carne essa afiada indiferença
Essa tirana a me manter sob a chibata

Já não conheço a tua posição exata
Nenhum bilhete ou uma carta a indicar tua presença
Me restam o silêncio, essa reza, essa crença
De que o sofrer já não me fortalece, mata

Vagas por tantas camas, tantos braços
Inebriada em mil amassos
Em busca da perfeição

Corre que o tempo arma os seus laços
E dentro em breve em poucos passos
Verás que foi tudo em vão.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Ainda resta amor em mim



Ainda resta amor no meu peito
Grande, quente e forte
Jorrando e escorrendo liqüefeito
Vermelho te sinalizando o norte

Vem sorver o que é teu por direito
Que sem tua boca não há quem conforte
Mas vem com cuidado, carinho e jeito
Pois se derramas uma gota é a própria morte

Vem se entrega, sucumbe ao meu apelo
Corre, anda, pega logo essa estrada
Montada em seu cavalo, galopando nua em pelo

Salta, se joga, se abriga no meu zelo
Ave errante e machucada
Pousa logo, vem vivê-lo

Uma lua apenas




Reluziu em mim, a saltar a tua imagem
Quando fitei teu sorriso branco
Meu corpo a saltar num impulso, solavanco
Olhos felinos e o pelo amarelo, miragem

Antecipei em sonhos essa viagem
De ver arfar teu alvo flanco
Alegre e farto como um saltimbanco
Pelas estações da vida sem bagagem

Teu visgo doce, calda quente a me queimar
Quando enfim toquei teu rosto, provei teu gosto
Já não me cabia mais outra coisa, a não ser te desejar

Foi uma noite apenas, extasiado a te ver dançar
Meu olhar aflito, a buscar teu rosto
No afã de reter tua imagem, tua beleza eternizar

Soneto passarinho






Cala a minha boca com um beijo
Com desdém e formalidade
Tu que me consumiste na mais tenra idade
Hoje me olhas com frieza e com desleixo
Vivo do teu lado desse jeito
Catando migalhas dessa caridade
Louco é o meu viver nessa disparidade
Suores de terror alagam o meu leito
Aí de mim por mostrar o quanto podia amar
Dissecando e expondo tudo que havia em mim
Fitam-me teus olhos de madeira, sem se apiedar
Esse amor soturno, esse sofrido penar
Quisera ser pardal, prosaica ave, fugir assim
Sacudir minhas asas loucas, no etéreo azul do ar.

Últimos passos




Senta já vai chegar tua hora
A fronte baixa a vista turva
A pele frágil a junta dura
Não há nada mais que se faça agora

Não se vê mais o meu rosto
Foi todo tomado, exposto
Profundos sulcos e largas rugas
Avenidas do desgosto

Meu sorriso se foi com meu marfim
Meus pés se arrastam no corredor
Meu caminhar somente dor
É a cortina que se fecha, caindo sobre mim

São tantas datas me lembro sim
São tantas velas que já não cabem na torta
Que haja muitas então, a alumiar meu fim
Em volta do caixão, ladeando minha face morta

Esse peso de tudo que se viveu
Me encurva sempre em direção a terra
Esse firmamento que o triste fim encerra
Receba mais um filho teu

Para a sogra com amor



Não sou do tipo que a sogra gosta
Tenho um filho sem ter casado
“Minha filha tome cuidado, produção independente”
Não fui orador da turma de noventa e cinco
Não sou funcionário público
“Minha filha tome cuidado, não parece boa gente”
Não fiquei rico, nem virei senador
Vivo na corda bamba, nem sequer um assessor
“Minha filha tome cuidado, vai morar com um indigente?”
Há minha sogra querida
Um dia caso com tua filha
E vamos todos morar na ilha, do famoso governador
Lá no morro do batente
Te hospedo no quarto lá da frente
Que numa chuva de repente
É o primeiro a ir na enchente
Vai pra o diabo que te carregue
Velha chata, impertinente.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Variações sobre o mesmo tema

E tenho dito
Esse tema constante
Como pode o poeta fazer poesia
Sem que no peito bata um coração errante?

terça-feira, 8 de setembro de 2009

A casa é sua.


Fui marcado a ferro em brasa

Quando te deixei invadir a minha casa

E fazer dela a tua morada


Ficastes a vontade como quem já conhecia

Bagunçastes a sala, revirastes a cozinha

Mudastes tudo de lugar e a casa já não me pertencia


Em toda brecha o teu cheiro

Em todo espelho a tua imagem

Saístes como quem foge ligeiro

Ligeiro que até esquece a bagagem


O quarto órfão do teu calor

A cozinha sem teu tempero, sem sabor

O Banheiro sem tuas ancas, sem odor

A minha vida sem a tua, sem amor.


Fábio Viégas 8 de Setembro de 2009