quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Sigo...




Resta-me o som do mundo
E todas as coisas ao meu redor
Resta-me um desejo profundo
De que tudo se torne melhor

Sobram-me motivos e razões
Para acreditar sempre na vida
Embora haja ocasiões
Em que se deseje mais a partida

Meu rosto essa terra fértil
Onde brotam risadas e lástimas
Meu corpo inconstante e febril
Regado a suores e lágrimas

Forte é esse gosto metálico
Que paira no céu da boca
É vácuo do teu beijo cálido
Ausência da tua língua louca

E sigo em frente sem olhar pra traz
Com meu saco de sorrisos e histórias
Instantes tatuados na memória
De um homem em busca de paz.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Tempo





Dessa aspereza que nos tolhe
O que me sufoca e me encolhe
É o tempo e sua pressa

De me atropelar sempre que paro
Mesmo ferido procurando amparo
A sua engrenagem nunca cessa

Anda preso sempre ao meu braço
Nesse impiedoso compasso
Sem remorso não volta atrás

Se corre muito apresso o passo
Se lento anda é descompasso
Confiro a pilha não tenho paz

E escravo sigo nesse viver
Desesperado sempre a correr
Contra algo que não posso vencer

Não pude cultivar as flores
Nem sorver a plenitude dos amores
Que a vida em sua finitude me ofereceu

Dirão de mim "Esse coitado
Que viveu sempre apressado
Agora jaz aqui enterrado
 Mais um que o tempo venceu".

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Memórias




Às vezes penso nas coisas
Que podiam ter sido e não foram,
Perderam-se em algum lugar escondido
Somente na memória e no coração ficaram
Quietas em seus lugares, imóveis, empoeiradas
Às vezes as visito, tiro o pó
Às vezes me pego sorrindo, outras me vejo só
Momentos que queria ressuscitar
Trazer de volta a vida
Fechar a ferida
Poder tocar
Essa traquitana de lembranças
Amontoadas no meu pensar
Trazem-me a esperança
De novas memórias ganhar
Espero as mais felizes
Mas sei das cicatrizes
Que a vida há de deixar.

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Caleidoscópio




Tenho todas as cores em mim
O branco da paz que não encontrei
O azul do céu que nunca toquei
O verde esperança que jamais tem fim

No amarelo do medo a me embotar assim
No vermelho do sangue me apavorei
No preto véu da noite, cego tateei
No rosa da tua carne descansei enfim

Todas as nuances desse etéreo arco
No balançar das tuas ancas feitas de giz
A deslizar no meu leito, doce meretriz

Entre tuas coxas vou fincar meu marco
Arder em suores, calores febris
Vou pintar o sete, te fazer feliz.

segunda-feira, 28 de setembro de 2009

Segredos de mulher.


Não perguntes nunca do passado
Da mulher se não queres sofrer
Natural da companheira esconder
As aventuras da sua vida para o amado

Passado perfeito, limpo e ilibado
É a imagem que se quer vender
Pelo simples medo de perder
O novo amor que agora se tem ao lado

Histórias toda fêmea tem
Umas mais puras outras nem tanto
Contos de alcova que não convém

Mas não te julgo e nem a ninguém
Se te escondes detrás do manto
É pra não veres partir o teu bem.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Sair da margem, mergulhar em mim.





Cansei de viver a margem de mim
Observar de fora o acontecimento
Expectador da vida, do seu movimento
Essa ausência, essa coisa ruim

Não quero mais viver assim
Estar de fora, esse afastamento
Sob o olhar do outro, esse julgamento
Quero a liberdade, respirar enfim

Rédeas da vida, ter na minha mão
Dominar meu sim, disparar meu não
Caminhar na serra, flutuar no mar

Beijar a menina, mergulhar no ar
Eu dentro de mim, minha habitação
Abraçar minh´alma, ver meu coração.

domingo, 20 de setembro de 2009

É mais forte do que eu.





Como um zunido constante, uma abelha
Escuto essa voz que não cala
Uma chama, uma brasa, centelha
É papel e caneta e tudo me abala

Ecoam os pingos da chuva na telha
Me ponho louco a caminhar na sala
Traga-me vinho, solução vermelha
Limpando a mente, clareando a fala


Essa secura de escrever não cessa
Mesmo que eu cansado, pare, ore, peça
Mesmo que cesse o clamor da alma

Nada que eu faça há que impeça
Dê-me uma folha, saia e se despeça
Se não escrevo, nada mais me acalma.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Gato pingado???




Não conheci Fulano
Nem Cicrano
Nem o Zé ninguém

Esse Gato pingado
Essa Alma penada
Beltrano? Eu heim

É tanta pouca gente
Quando se quer falar
Que tanta gente não tem

É tanta gente sem rosto
Sem pé, nem cabeça, sem gosto
Sem nexo tanta gente vem

Habitar os lugares vazios
Das festas e dos bailes sombrios
Ausência de tanto alguém

Acredito em alma penada
Fulano e cicrano
Beltrano? Acredito também

Mas o que danado é gato pingado?
E se pinga, pinga em cima de quem?
E se existe onde diabo tem?

Amor de menino.




Parece estranho esse desatino
Esse sonho a me seguir
Será real ou quer me iludir?
Isso que me habita desde menino

Esse brilho a me conduzir
Radiante qual um sol matutino
A tua voz som do cristalino
Canta a sereia a me seduzir

Te quis desde a mais tenra idade
Com doçura nunca com maldade
Um abraço apenas, esse teu calor

Crescemos eu e tu e essa temeridade
De te ver partir e só restar saudade
E eu ficar menino sem o seu amor

Soneto do breve encontro.




Luz para meu peito
Foi conhecer-te aquele dia
Andar ao teu lado, admirar teu jeito
Guardar em mim a tua geografia

Eu que de desilusão era feito
Mergulhado em minha apatia
Escutei num compasso perfeito
Meu coração saltar de alegria

E segui a caminhar teus passos
Ditando um resumo de nossas vidas
Buscando estabelecer os laços

Conexões antes das despedidas
Sonhando em tê-la em meus braços
Evitando as tuas partidas

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Amor Errante




O teu silêncio é o que me mata
Antes uma briga, um escarro, a desavença
A sentir na carne essa afiada indiferença
Essa tirana a me manter sob a chibata

Já não conheço a tua posição exata
Nenhum bilhete ou uma carta a indicar tua presença
Me restam o silêncio, essa reza, essa crença
De que o sofrer já não me fortalece, mata

Vagas por tantas camas, tantos braços
Inebriada em mil amassos
Em busca da perfeição

Corre que o tempo arma os seus laços
E dentro em breve em poucos passos
Verás que foi tudo em vão.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Ainda resta amor em mim



Ainda resta amor no meu peito
Grande, quente e forte
Jorrando e escorrendo liqüefeito
Vermelho te sinalizando o norte

Vem sorver o que é teu por direito
Que sem tua boca não há quem conforte
Mas vem com cuidado, carinho e jeito
Pois se derramas uma gota é a própria morte

Vem se entrega, sucumbe ao meu apelo
Corre, anda, pega logo essa estrada
Montada em seu cavalo, galopando nua em pelo

Salta, se joga, se abriga no meu zelo
Ave errante e machucada
Pousa logo, vem vivê-lo

Uma lua apenas




Reluziu em mim, a saltar a tua imagem
Quando fitei teu sorriso branco
Meu corpo a saltar num impulso, solavanco
Olhos felinos e o pelo amarelo, miragem

Antecipei em sonhos essa viagem
De ver arfar teu alvo flanco
Alegre e farto como um saltimbanco
Pelas estações da vida sem bagagem

Teu visgo doce, calda quente a me queimar
Quando enfim toquei teu rosto, provei teu gosto
Já não me cabia mais outra coisa, a não ser te desejar

Foi uma noite apenas, extasiado a te ver dançar
Meu olhar aflito, a buscar teu rosto
No afã de reter tua imagem, tua beleza eternizar

Soneto passarinho






Cala a minha boca com um beijo
Com desdém e formalidade
Tu que me consumiste na mais tenra idade
Hoje me olhas com frieza e com desleixo
Vivo do teu lado desse jeito
Catando migalhas dessa caridade
Louco é o meu viver nessa disparidade
Suores de terror alagam o meu leito
Aí de mim por mostrar o quanto podia amar
Dissecando e expondo tudo que havia em mim
Fitam-me teus olhos de madeira, sem se apiedar
Esse amor soturno, esse sofrido penar
Quisera ser pardal, prosaica ave, fugir assim
Sacudir minhas asas loucas, no etéreo azul do ar.

Últimos passos




Senta já vai chegar tua hora
A fronte baixa a vista turva
A pele frágil a junta dura
Não há nada mais que se faça agora

Não se vê mais o meu rosto
Foi todo tomado, exposto
Profundos sulcos e largas rugas
Avenidas do desgosto

Meu sorriso se foi com meu marfim
Meus pés se arrastam no corredor
Meu caminhar somente dor
É a cortina que se fecha, caindo sobre mim

São tantas datas me lembro sim
São tantas velas que já não cabem na torta
Que haja muitas então, a alumiar meu fim
Em volta do caixão, ladeando minha face morta

Esse peso de tudo que se viveu
Me encurva sempre em direção a terra
Esse firmamento que o triste fim encerra
Receba mais um filho teu

Para a sogra com amor



Não sou do tipo que a sogra gosta
Tenho um filho sem ter casado
“Minha filha tome cuidado, produção independente”
Não fui orador da turma de noventa e cinco
Não sou funcionário público
“Minha filha tome cuidado, não parece boa gente”
Não fiquei rico, nem virei senador
Vivo na corda bamba, nem sequer um assessor
“Minha filha tome cuidado, vai morar com um indigente?”
Há minha sogra querida
Um dia caso com tua filha
E vamos todos morar na ilha, do famoso governador
Lá no morro do batente
Te hospedo no quarto lá da frente
Que numa chuva de repente
É o primeiro a ir na enchente
Vai pra o diabo que te carregue
Velha chata, impertinente.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Variações sobre o mesmo tema

E tenho dito
Esse tema constante
Como pode o poeta fazer poesia
Sem que no peito bata um coração errante?

terça-feira, 8 de setembro de 2009

A casa é sua.


Fui marcado a ferro em brasa

Quando te deixei invadir a minha casa

E fazer dela a tua morada


Ficastes a vontade como quem já conhecia

Bagunçastes a sala, revirastes a cozinha

Mudastes tudo de lugar e a casa já não me pertencia


Em toda brecha o teu cheiro

Em todo espelho a tua imagem

Saístes como quem foge ligeiro

Ligeiro que até esquece a bagagem


O quarto órfão do teu calor

A cozinha sem teu tempero, sem sabor

O Banheiro sem tuas ancas, sem odor

A minha vida sem a tua, sem amor.


Fábio Viégas 8 de Setembro de 2009

domingo, 17 de maio de 2009


Campina doce menina

Por entre as serras a descansar

O teu lençol feito de neblina

Encobre as belezas que o sol faz revelar

 

Vim me abrigar em teus braços

Enebriar-me em teus amassos

Em tuas ruas caminhar meus passos

Nos teus ombros meus cansaços encostar

 

Sentir no rosto o teu ar invernal

Poder voltar a ser menino

Esconder-me em teu vestido junino

Numa festa sem igual

 

Há teu São João

Fogueira, bandeirola e balão

Forró, Luiz Gonzaga, baião

Do mundo se fez o maior e outro não existe não

 

Sois a rainha da Borborema

Nascida como de um poema

Onde o povo nasce e sonha

Sem pesadelo ou aflição medonha

 

Lá onde brigam o galo e a raposa

Voam a borboleta e a mariposa

Por sobre a praça do poeta adormecido

Nunca vi lugar mais belo nem nada parecido

 

Eis me aqui Campina Grande

Vim tomar-te como amante

Em teu seio me aninhar

 

Cuida de mim princesa da serra

Que por ti meu amor nunca se encerra

E em devoção irei te amar.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Despojos de guerra


Castiguei com meus olhos a tua inocência
Quando fitei teu corpo branco em flor
Desejei tua boca rosada, molhada ao redor dos dentes
Teu peito arfante e inquieto, alvos seios inocentes

Tuas mãos pequenas teus olhos de mar
Tomavam e retinham tudo que havia em mim
Meu corpo queima, minha boca seca
Nada há mais em mim que não te pertença

Nada há em ti que eu não deseje
Eu te violo em pensamentos
Em espasmos de gozo e êxtase
Perco-me no vale entre os brancos montes

Já não somos dois e a fusão é completa
Tu ris e choras, olhos cerrados, mãos espalmadas
Os lábios mordidos e as pernas a me laçar
De repente meu nome explode em tua boca

Teu corpo desfalece como pássaro abatido em vôo
Leves espasmos restam ainda, despojos de guerra
Teus poros se desfazem do arrepio
E eu te abraço e te abraço.
Fábio Viégas 02/Abril/2009