quinta-feira, 29 de setembro de 2011

A puta



O copo a frente e o som que aqui se escuta
Senta-se ao meu lado sem ser convidada a puta
Envenena-me os ouvidos, qual um trago de sicuta
Obrigado e passar bem, siga com a sua luta
 
Me concentro no liquido a minha frente
E abstraio dissolvendo toda a gente
Menos ela em sua insistência absoluta
Tenta seduzir-me ferozmente a puta
 
No fundo dos seus olhos o desespero revelado
Da dignidade perdida em um trocado
Se faz mister resistir em sua labuta
 
Quase cedo não fosse o cheiro exalado
De mil homens em seu corpo empreguinado
Quem acha essa vida fácil, nunca precisou ser puta

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Sobras de mim





Envolto em silêncio e apatia
Sou apenas vácuo do que já fui um dia
Sepultado no que já não existe mais
Sou barco a vela amarrado ao cais

Sorriso pálido, desbotado e absorto
No espelho já não enxergo um rosto
Escuto gritos de loucura e agonia
Ecos do que outrora em mim morria

Hoje perambulo entre a sorte e a revelia
Desprovido de afeto e alegria
Navegante vendo o mar e preso ao porto

No prenúncio do fim, um alento, um conforto
De poder enterrar-se enfim o morto
Libertar a alma juntar-se a ventania.

Soneto fúnebre de um egoísta




Abraça-te enfim a morte
Terror de todo vivente
Certeza única que encerra a sorte
Nivelando toda essa gente

Jazendo sob sete palmos
O cessar de toda ambição
Sobre a cabeça lêem-se os salmos
No mármore do derradeiro chão

Nada levou do vil metal acumulado
Nem ele, nem que jaz ali ao lado.
Só um terno barato como companhia

Compadeço-me desse pobre coitado
O epitáfio o resume na lápide fria
“Partiu sem deixar saudades, aquele que não dividia”.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Viagem



Na véspera da tua partida fez-se o nada

Silêncio que violenta a calma

Impiedosa transpassa a espada

E fere mortalmente a alma



Prenúncios alardeados da jornada

Da tua viagem que é só de ida

Escorre por entre as mãos a vida

Some no horizonte a mulher amada



Restam pegadas, o chão, o pó

Vicissitude que se desfez

Sufoca-me a garganta o nó



Num estalo de loucura e Insensatez

Penso vê-la mais uma vez

É saudade, o regalo ofertado ao só

Eu não vim para ficar


Eu coleciono nuvens

Onde os homens ajuntam moedas

Eu não vim para ficar

Estou apenas de passagem



Sou um farol para os loucos

Que ainda vêem rosas no asfalto

Que são feitos de sonho

E recheados de ausência



Semente que não passa da promessa

Não cria raízes, frutos jamais vai dar

Estou apenas de passagem

Eu não vim pra ficar



No fundo dos meus olhos castanhos

Uma sombria expressão secular

Dos caminhos que não conheci

Das terras que não vou pisar



Teus caminhos sempre exatos

Destoam da arritmia dos meus passos

E a tua pisada objetiva

Fere meu ébrio caminhar



Diferimos na feitura da matéria

Eu de substância etérea

Você da que se pode contar



Se sabes que não pertenço ao seu mundo

Por quê me aprisionar?

Já falei que estou de passagem

Do seu lado não vou ficar

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Tormenta



Com velas desajustadas sigo

Por entre tormentas navego

Nas sobras da fé me apego

Cego e alheio ao perigo



Não vejo nem um palmo a frente

Perdido em meio a tanta gente

Entre lobos caminho inocente

Sou cordeiro morrendo docemente



Como um Cristo pregado na cruz

Um ingênuo adentrando um cabaré

Muito menino, pouco Jesus

Se faz mister ficar em pé.



Onde poucos estendem a mão

Onde o sim sucumbiu ao não

Onde morre insepulto meu coração.

Terra infértil, mundo cão